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Aos 50 anos, Sérgio Vita carrega no olhar a serenidade de quem já enfrentou batalhas internas e externas, e no corpo a disciplina de uma vida dedicada às artes marciais. Carioca de nascimento, nascido no Rio de Janeiro, ele encontrou no jiu-jitsu não apenas uma profissão, mas um caminho de vida. Foi essa escolha, feita ainda na juventude, que o levou a transformar não só sua própria história, mas também a de milhares de pessoas em Portugal, na Europa e além.

“Trago comigo a disciplina e a força de quem encontrou no caminho marcial uma forma de vida”, resume, quando se apresenta.

As raízes no Brasil e o chamado do tatame

A relação de Sérgio com o jiu-jitsu começou cedo, no Brasil. Em 1991, aos 16 anos, assistiu pela televisão ao famoso evento O Grande Desafio, onde o jiu-jitsu surpreendeu ao vencer todos os combates contra a luta-livre. Aquele momento foi como uma epifania. “Percebi que havia encontrado o meu caminho. Foi como ouvir um chamado do destino”, relembra.

Poucos anos depois, em 1995, já estava nos tatames não só como aluno, mas como professor. Aos 20 anos, iniciou sua jornada como instrutor de jiu-jitsu, ensinando técnicas, mas, sobretudo, transmitindo valores de disciplina, respeito e superação.

Essa conexão com a arte foi tão profunda que Sérgio não se imaginava em outro lugar. O tatame tornou-se seu espaço de vida, sua missão e seu refúgio. Mas o Brasil, ainda que fosse o berço da modalidade, começou a parecer pequeno para o tamanho dos sonhos que carregava.

A decisão de partir

No início dos anos 2000, Sérgio percebeu que as perspectivas de crescimento estavam limitadas. A situação no Brasil era desafiadora, e um amigo próximo fez um comentário que mudaria o rumo da sua trajetória: em Portugal, quase não havia jiu-jitsu.

Movido pela coragem e pelo desejo de expandir horizontes, ele decidiu atravessar o oceano. “Tomei a decisão de vir, movido pelo espírito de coragem e pela busca de horizontes mais amplos. Apaixonei-me pelo país e pela sua cultura, e em 2003 conheci a mulher que se tornaria minha esposa. Vim sozinho, mas aqui construí uma nova família”, conta.

Chegou a Portugal em 2002 e, como ele mesmo descreve, a adaptação foi natural. “Sempre busquei respeitar e aprender com a cultura dos lugares que visito e principalmente daquele que escolhi viver. Fui bem recebido desde o início. Usando as palavras do poeta e escritor Fernando Pessoa: ‘primeiro estranha, depois entranha.’ E comigo foi exatamente assim.”

Os primeiros desafios

Se a recepção cultural foi positiva, a jornada profissional exigiu resiliência. O jiu-jitsu era pouco conhecido em Portugal, e a falta de compreensão sobre seus benefícios era um obstáculo. “Poucos sabiam do seu valor físico e social, e por isso precisei mostrar, com paciência e dedicação, do que esta arte era capaz”, recorda.

Para divulgar o jiu-jitsu, Sérgio fez apresentações em escolas, clubes, centros comerciais e até festas de aniversário. Paralelamente, trabalhava como segurança de discoteca e salva-vidas, funções que exerceu durante 10 anos até conseguir viver apenas do ensino. Foi uma década dura, mas forjada na determinação.

“Dificuldades existem sempre, mas o guerreiro não se detém nelas, apenas as enfrenta”, afirma, com a convicção de quem aprendeu a transformar obstáculos em degraus.

O apoio da irmandade

Apesar das dificuldades, Sérgio não estava totalmente sozinho no caminho. Encontrou apoio em companheiros de tatame que, assim como ele, acreditavam no potencial do jiu-jitsu em Portugal. “Dois irmãos de luta me deram grande apoio: Marcelo Bernardo, do Rio, e Sérgio Melo, de Alagoas. Fomos companheiros de casa por quase dois anos, e até hoje tenho estima e gratidão por essa irmandade forjada no tatame.”

Essas conexões foram fundamentais para fortalecer a base de um projeto que, anos depois, se transformaria em algo muito maior.

Do Sporting Clube à sua própria academia

O primeiro grande passo em Portugal foi dado quando Sérgio começou a lecionar no Sporting Clube de Portugal, um dos maiores clubes do país. A experiência abriu portas e trouxe credibilidade ao seu trabalho, além de preparar o terreno para a abertura de sua própria academia.

“No início, preocupava-me apenas com a licença de treinador. Hoje, o processo é mais exigente e burocrático, mas cada desafio vale a pena quando se constrói algo sólido e honrado”, comenta.

O ritmo de crescimento foi pautado pela disciplina. Sérgio gosta de citar José Saramago para definir esse processo: “sem pressas, mas sem perder tempo”.

O nascimento da Icon JJ Team

Em 2010, Sérgio uniu forças com dois amigos e juntos fundaram a Icon JJ Team, que rapidamente ganhou espaço dentro e fora de Portugal. Hoje, a rede está presente em vários continentes, levando o jiu-jitsu a milhares de pessoas.

Mais do que uma equipe, a Icon se tornou uma filosofia de vida, expandindo os valores do tatame para além das competições. É uma bandeira que representa disciplina, honra e superação.

Impacto além das lutas

O trabalho de Sérgio foi transformador tanto para a comunidade brasileira como para a portuguesa. Para os brasileiros, as academias de jiu-jitsu tornaram-se espaços de acolhimento, onde encontraram identidade e pertencimento em terras estrangeiras.

Já para os portugueses, o impacto foi multifacetado. “O jiu-jitsu é mais que desporto: é ferramenta pedagógica, social e até profissional, sobretudo para forças de segurança, que aprendem a controlar sem ferir. O impacto vai além do tatame, pois toca o corpo, a mente e o espírito”, explica.

Cada aluno chega com um propósito diferente: saúde, disciplina, autodefesa ou simplesmente qualidade de vida. Mas todos saem com algo em comum: a certeza de que o jiu-jitsu é uma ferramenta de transformação.

A filosofia do guerreiro

A trajetória de Sérgio é marcada pela filosofia do Bushido, o código de honra dos samurais: constância, disciplina e respeito. É essa filosofia que ele aplica em sua vida pessoal e profissional.

“Meus planos seguem o caminho do guerreiro: melhorar sempre, etapa por etapa. O objetivo é único: entregar o melhor aos nossos alunos, mantendo o espírito marcial, a disciplina e a honra que o jiu-jitsu exige.”

Essa visão o mantém firme mesmo diante das adversidades e o inspira a olhar sempre para frente, sem perder a essência que o trouxe até aqui.

O futuro da Icon JJ Team

Os próximos passos da trajetória de Sérgio são de expansão. Atualmente, ele e sua equipe estão concluindo as obras da nova academia, com uma sala maior para a preparação física dos atletas. Além disso, a Icon JJ Team está ampliando sua presença internacional, com escolas na Austrália e na Arábia Saudita.

Esse crescimento, no entanto, não é apenas quantitativo. Para Sérgio, cada nova academia representa mais do que um espaço de treino: é um centro de transformação, onde vidas são tocadas e histórias são reescritas.

Um legado em construção

De um jovem carioca que viu no tatame a chance de mudar a própria vida a um mestre que espalha o jiu-jitsu pelo mundo, Sérgio Vita construiu uma trajetória marcada por coragem, disciplina e visão.

Ele não apenas abriu academias abriu caminhos. Não apenas formou alunos formou cidadãos. E não apenas venceu desafios transformou-os em combustível para seguir adiante.

Hoje, ao olhar para trás, vê que cada passo, cada apresentação em escolas, cada noite como segurança ou salva-vidas, cada treino e cada batalha o trouxeram até aqui. Um homem que transformou o sonho de juventude em um legado global.

Instagram: @iconjiujitsuteampt